A busca por vida fora da Terra sempre começou com a mesma pergunta: um planeta distante pode sustentar algo parecido com a vida humana? Água líquida, temperaturas moderadas e condições semelhantes às da Terra costumam guiar esse tipo de investigação. Mas um novo estudo ligado ao SETI (Search for Extraterrestrial Intelligence, a busca científica por inteligência extraterrestre) propõe uma mudança clara de foco: em vez de procurar vida, procurar tecnologia.
Pesquisadores da iniciativa Breakthrough Listen analisaram observações de rádio de 27 exoplanetas — planetas fora do Sistema Solar — durante um momento muito específico chamado eclipse secundário, quando o planeta passa por trás de sua estrela do ponto de vista da Terra. É nesse instante que surge uma oportunidade rara e poderosa para identificar sinais artificiais.
A ideia é simples e elegante. Se uma civilização tecnologicamente avançada estiver transmitindo sinais de rádio a partir de um planeta, de uma lua ou até de uma plataforma artificial próxima, esse sinal deve desaparecer temporariamente quando o planeta fica oculto pela estrela e reaparecer logo depois. Esse padrão de “liga e desliga”, sincronizado com um evento astronômico previsível, seria extremamente difícil de explicar como fenômeno natural ou interferência humana.
O ponto mais inovador do estudo é que a habitabilidade não foi usada como critério. Os pesquisadores deixaram claro que tecnologia não depende, necessariamente, de climas semelhantes ao da Terra. Por isso, o levantamento incluiu uma grande variedade de mundos: gigantes gasosos, planetas ultrquentes, sistemas compactos e órbitas em torno de diferentes tipos de estrelas.
Os dados analisados vieram do radiotelescópio Murriyang, na Austrália, anteriormente conhecido como Parkes, coletados entre 2018 e 2022. O instrumento varreu uma ampla faixa do espectro de rádio, entre 704 e 4.032 megahertz, frequências tradicionalmente consideradas promissoras para comunicação interestelar. Para identificar os alvos certos, a equipe cruzou essas observações com informações do TESS (Transiting Exoplanet Survey Satellite, satélite da NASA dedicado à busca de exoplanetas).
Durante o processo, quase dois milhões de sinais potenciais foram inicialmente detectados. Após filtros automáticos e análise detalhada, nenhum deles passou em todos os critérios necessários para ser considerado uma tecnossinatura, termo usado para indicar sinais de origem tecnológica não natural.
Apesar disso, o estudo está longe de ser visto como um fracasso. Ao não encontrar sinais, os cientistas conseguiram estabelecer limites claros sobre quão poderosa precisaria ser uma transmissão alienígena para ser detectada da Terra. Esses limites variaram de trilhões a quatrilhões de watts, dependendo da distância do planeta observado.
Para efeito de comparação, o antigo radiotelescópio de Arecibo, em Porto Rico — o mais potente radar planetário já construído pela humanidade — operava com cerca de 20 trilhões de watts. Segundo os cálculos do estudo, mais da metade dos exoplanetas analisados teria sido detectável se possuísse transmissores com potência semelhante à de Arecibo.
Mais do que números, o principal legado do trabalho está no método. O estudo demonstra que buscas por tecnossinaturas baseadas em eclipses são viáveis com dados já existentes e oferecem uma vantagem importante: um mecanismo natural de verificação que reduz drasticamente falsos positivos causados por interferência terrestre.
Os autores destacam que civilizações avançadas, se existirem, podem não limitar sua tecnologia à superfície de planetas. Transmissores podem estar em órbita, em luas ou em estruturas artificiais, longe de qualquer conceito tradicional de “zona habitável”.
O silêncio observado não descarta a existência de inteligência extraterrestre. Pelo contrário, ajuda a refinar onde e como ouvir. Ao redefinir o SETI como uma busca por tecnologia, e não apenas por biologia, o estudo reforça uma mudança sutil, mas profunda, na forma como a ciência encara o universo.
Se houver inteligência lá fora, ela pode não viver onde esperamos. Mas suas máquinas, se estiverem transmitindo, ainda podem deixar rastros que aprendemos, pouco a pouco, a reconhecer.







